OBRIGADA MEU DEUS.. POR
ME PROPORCIONAR O DIA DE HOJE!
E o Feio que se tornou Belo
...
Na roda de amigos, entre uma cerveja e outra, o marido conta com entusiasmo sua
mais nova aventura extraconjugal. Não é culpa dele afinal ser um sedutor
incorrigível. Os amigos o saúdam, entre risos. Na casa de umas amigas, a
esposa, que já estava a par do caso, conta-lhes a vingança que estava
preparada: ao chegar em casa, o infiel se depararia com outro homem ocupando o
seu lugar na cama, ao lado dela. As ouvintes a aplaudem, dando-lhe parabéns por
sua trama maquiavélica.
Neste mesmo instante, em casa, o filho mais velho do casal postava em seu
perfil no Facebook, fotos da festa a que fora no último fim de semana,
nas quais aparece sendo carregado, inconsciente, por companheiros menos
alcoolizados. Poucos minutos depois, haveria um número recorde de amigos que
"curtiriam" a postagem e deixariam comentários, a bem dizer,
elogiosos. E tudo o que era, em tese, condenável, acabou sendo tratado como
ação louvável e digna de aplausos.
Vivemos, hoje, o fenômeno da inversão de valores. O
nosso lado mais sórdido e mais primitivo está a ser o mais aplaudido. Nas
músicas, nas novelas, no cinema, nossos erros parecem estar se convertendo em
motivos de orgulho. Não é raro ouvirmos de alguém que fala sem disfarçar a
vaidade: "Sou vingativo como meu pai", aparentando não se dar conta
de que fala a respeito de um defeito de seu ancestral.
A infidelidade, a violência e o destempero são tão exaltados na mídia que
começamos a nos sentir honrados ao admitirmos que possuímos tais
características; ao passo que à fidelidade, à mansidão e à prudência foi
atribuído um rótulo de fraqueza, de covardia e, até mesmo do célebre
"falso moralismo", uma vez que as correntes de pensamento modernas
tratam como hipócrita qualquer demonstração de restrição moral.
A "malandragem", outrora
termo pejorativo, hoje é o atributo dos vencedores, de quem fica por cima, e é
defendida sob máximas falaciosas e cínicas que se tornaram moda: "quem não
engana é enganado", "todo mundo é corrupto", "ladrão que
rouba ladrão tem cem anos de perdão"...
Enfim, nossas misérias humanas e nossa capacidade
de sermos maus e baixos parecem ter graça. De repente, nossos defeitos se
tornaram qualidades, sem uma explicação coerente para isso.
Nas escolas, os jovens riem da ingenuidade de professores que aceitaram
trabalhos plagiados, ou que não perceberam que estes "colaram" nas
provas. Maior motivo de chacota porém, são os colegas que não foram às festas
porque passaram horas estudando e, ao fim, tiraram notas semelhantes; aquela
minoria, formada por colegas que só pensam em estudar, que não fazem baderna,
que não participam de festivais de promiscuidade nas "baladas",
recebe mil alcunhas e deboches.
Qualquer semelhança com o comportamento de pais que
enriquecem à custa da exploração do trabalho alheio, ou da credulidade do seu
empregador (aquelas horas extras que foram declaradas em número
"levemente" superior ao real, aquele pequeno desvio do dinheiro da
empresa) e debocham dos companheiros que não o fizeram terá sido mera
coincidência?
Em nosso tempo, nada contra a corrente aquele que
defende a ética, a dignidade, o respeito. É preciso ter muita coragem para
andar na contramão do mundo e permanecer fiel a valores que são tachados de
retrógrados e inúteis, pois o que antes era feio, subitamente tornou-se belo, e
quem não se adaptou a esta mudança, costuma ser o estranho do ninho. Ainda
assim, talvez, a sociedade, em breve, tenha forçosamente de se perguntar
o porquê de todo o progresso global e todo o avanço nas mais diversas áreas se
dever aos "chatos" e "certinhos" que, apesar de rejeitados,
ainda movem o mundo.”
Liziê Moz
(Estudante)
Artigo publicado em Zero Hora, em 13/08/2012